ateliê da artista
De onde você é e onde vive atualmente?
Nasci em Florianópolis e atualmente vivo e trabalho aqui. Isso depois de ter morado 27 anos em São Paulo e feito toda a minha formação artística na cidade.
A melhor parte de viver aqui - e talvez também a pior - é a desaceleração da vida cotidiana. A falta de aceleração te deixa menos criativa. Por isso volto sempre a São Paulo para reviver a loucura da vida apressada, e assim volto cheia de ideias.
Como e quando as artes plásticas entraram em sua vida?
Fui morar em São Paulo para fazer faculdade de artes – se não fosse artes, seria arquitetura. Fui estudar na faculdade Belas Artes, mas não terminei o curso. Depois, trabalhei com criação em algumas agências de publicidade. Num determinado ponto decidi mergulhar no universo artístico e fui frequentar o ateliê de alguns artistas. Sempre convivi com muitos, como Tuneu, Paulo Pasta, Dudi Maia Rosa, Ana Maria Tavares e outros.
Por um período tentei equilibrar outras atividades com a vida de artista, porque é muito difícil viver só de arte. Fiz cerâminca e era sócia em um ateliê com mais duas pessoas – fazíamos utilitários para pagar o artístico.
Em 1992, assumi a vida de artista: decidi só pintar e deixei tudo o mais de lado.
a artista em seu ateliê
Qual sua primeira memória de estar criando?
Desde sempre. Quando criança eu adorava desenhar e ler. Vivia nesse mundo paralelo criando desenhos enquanto outras crianças brincavam. Na escola já tinha potencial e vivia desenhando nas margens dos cadernos. Desenhando, transformava palitos de picolé em marcadores de páginas.
Do que você necessita quando está criando?
Meu processo criativo vem da observação e do desenvolvimento da ideia inicial. Essa ideia inicial, para mim, pode vir de qualquer lugar – até limpando a casa ela pode aparecer. Meu passo seguinte é o mais importante: ir para o ateliê e trabalhar nessa ideia à exaustão até obter o resultado que considero satisfatório.
Tenho muito paz e tranquilidade para trabalhar em meu ateliê e isso também é fundamental.
Como é um típico dia em seu ateliê/espaço de trabalho?
Meus ateliês sempre foram em casa ou ao lado de casa. Em São Paulo, por praticidade. Com as distâncias e a perda de tempo no trânsito, o mais cômodo e prático seria ao lado.
Meu dia a dia é igual ao de todos. Também exerço outras funções, dona de casa, cuido do jardim, cuido dos meus bichos, visito amigas, vou a exposições e outras coisas da vida social. Mas, todos os dias coloco os pés no ateliê. É vital. Mesmo que eu não produza nada eu preciso entrar nele. Para organizar ou mesmo rabiscar uma ideia. No período em que estou muito possuída em produzir – uso a palavra possuída pois é assim que me sinto – abro mão de muitas coisas do cotidiano e me ponho a produzir até exaurir a ideia completamente.
ateliê da artista
Nos fale um pouco sobre a espontainedade x planejamento no seu processo criativo.
Como falei antes, a ideia vem de qualquer observação ou da minha cabeça. Depois descubro onde foi dado o start, mas o mais importante é a elaboração posterior. Não existe o grito d’alma. Existe o fazer e refazer, manipular o material para entender e ficar íntima dele até extrair tudo o que eu quero. O trabalho excessivo dentro daquela concepção anterior, daquela ideia inicial, para obter o resultado esperado.
Este segundo passo para mim é o planejamento.
Qual a parte mais difícil do processo criativo para você?
No início era não usar o suporte certo para a ideia. Agora que trabalho basicamente com tela e papel já sei o que posso explorar em cada um destes suportes. Assim, hoje já não sinto tanto esta parte que considerava difícil.
obra da série 'escadas para...'
colagens em papel couché sobre papel couché
20 x 20 cm, 2018, obra única
Por que a geometria, o trabalho com formas? Quando encontrou sua linguagem?
Acho que a geometria vem de uma vontade anterior da arquitetura. Do volume das coisas e dos espaços. Tenho uma facilidade para ver e montar espaços, dentro e fora de minha cabeça. E a geometria, que vem da matemática, para mim é a única ciência que não mente. Ela é a mais pura. Não deixa dúvidas.
detalhe do ateliê. escadinha que inspirou a série 'escadas para...'
Como é o uso de cores no seu trabalho? Têm preferências? Cores que não usa?
Descobri nos últimos anos que as cores estão muito relacionadas ao meu estado de espírito. Elas são selecionadas já na concepção da ideia. Tenho observado muito isto. Claro que às vezes percebo que a cor eleita não vai dar o caráter que imaginei para aquela ideia, e neste momento eu troco essa cor.
Como disse antes, a preferência fica por conta do momento, mas tenho uma cor que não trabalho. Confesso que até tenho dificuldade de usar, que é o verde. Para mim ela na natureza é tão exuberante que na tela perde a potência. Talvez porque sempre cultivei e vivi rodeada de plantas. No papel às vezes uso.
Quando você sabe que uma obra está finalizada?
Este é o grande desafio para o artista. Não passar do ponto. Não ir além da ideia inicial. Claro que, no transcorrer da execução, a ideia inicial pode ser alterada. Às vezes, e quando trabalho com cor principalmente, a mudança de uma cor ocorre no decorrer da feitura do trabalho. Mas se o artista estiver bem concentrado no seu fazer, ele sabe quando a obra está pronta. Na geometria este "estar pronto" fica mais visível. Diferente de um abstrato.
a escadinha passeando pelo ateliê.
outras obras da série 'escadas para...'
Nos fale mais sobre os trabalhos em colagem.
A colagem, depois do desenho, é uma maneira muito simples de expressão. Amo papel e sempre o utilizei. Não uso colagem com outro material, só com papel. Como falei antes, sobre minha linguagem, a colagem com papel me permite algumas coisas que a pintura sobre tela não permite.
A execução de algumas ideias têm um resultado melhor do que se tivesse sido feito com tinta, e vice versa. Acho que tenho paixão pelo papel e a manipulação dele, pois tenho sempre um resultado mais rápido. Em pequenas dimensões, eu consigo num dia de ateliê sair mais satisfeita com a quantidade de coisas que posso produzir. Gosto de produzir logo. O que na pintura, mesmo com acrílica, demora mais. Até mesmo se uso telas pequenas o processo demora mais. O papel me permite ter um volume de trabalhos prontos mais rápido. Eu trabalho com o papel desde que assumi ser artista.
O que a colagem não me permite, dentro desse meu processo, é a variação de cores. Fico engessada nas cores oferecidas pelas empresas que fazem o papel, enquanto que com a tinta eu elaboro uma gama de cores infinita.
trabalhos em colagem
Por quais artistas você é influenciada e admira? É influenciada por algum(a) que desenvolve um trabalho completamente diferente do seu?
Vamos ver quais artistas, a lista é imensa. Por ser geométrica não significa que só os geométricos me interessam, mas confesso que o meu olhar sempre cai sobre eles. Pierre Soulage, François Morelet, Aurelie Nemour, Carmen Herrera, Sacilotto, Hércules Barsotti, Mondrian, Willys de Castro, Piza, Rotko, Serra e outros tantos que até me esqueço.
Ano passado conheci o trabalho de uma artista bem desconhecida nossa, Hilma af Klint, e fiquei apaixonada não só pela obra como pela paixão dela pelo seu trabalho.
Alguns arquitetos também. A influência é uma coisa relativa. Na geometria parece que você já viu tudo. E que estou fazendo igual a todos - mas não é assim. As formas podem se assemelhar, mas o meu fazer é diferente de qualquer outro, porque sou eu fazendo. E assim é com todo artista, esta é a diferença.
E sim, gosto de repensar o que já foi feito para ter influência. As boas é claro.
Conheço a pessoa Cassia que a amizade foi fortalecida com o tempo. Desde cedo sempre admirei seu trabalho como artista plástica e hoje fico admirada como ela usa as formas e contornos tão facilmente de diferentes jeitos e maneiras. Cores e formas estão sempre em transformação. Ela chegou pra mim uma Artista completa.
Conheci a Cássia no tempo que ela morou em São Paulo.
Frequentamos o mesmo ateliê de cerâmica, e o trabalho da Cássia já era diferenciado. Daí em diante esse trabalho que passou para as telas e papéis foi crescendo e amadurecendo.
Tenho enorme admiração por ela, como artista e como pessoa e acompanho e comemoro cada sucesso.
Conheci a Cássia no tempo que ela morou em São Paulo.
Frequentamos o mesmo ateliê de cerâmica, e o trabalho da Cássia já era diferenciado. Daí em diante esse trabalho que passou para as telas e papéis foi crescendo e amadurecendo.
Tenho enorme admiração por ela, como artista e como pessoa e acompanho e comemoro cada sucesso.
Ótima entrevista que surpreende tanto quanto o trabalho da artista
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